junho 22, 2011
Em audiência pública realizada na Alerj no dia 21 de junho de 2011, a presidente do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), Marilene Ramos, foi interrogada pela Comissão Especial, presidida pela deputada Lucinha (PSDB), e integrada pelos deputados Paulo Ramos (PDT), Zaqueu Teixeira (PT) e Janira (PSOL). Estiveram presentes vários técnicos do Inea, moradores de Santa Cruz e representantes de ongs como Ibase e PACS (Políticas Alternativas para o Cone Sul), além de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ).
Marilene Ramos afirmou trazer parte das respostas aos questionamentos sobre a CSA recebidos pelo Inea, além de ter trazido também parte dos documentos solicitados pela comissão da Alerj. Marilene deu início às explicações em nome do órgão ambiental afirmando que a decisão de instalar o empreendimento naquela região cabe ao governo passado e que o papel do Inea é fazer com que a siderúrgica e as atividades portuárias sejam feitas dentro dos padrões ambientais e com o menor transtorno possível para a população – cumprindo tudo o que foi levantado no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e nas audiências públicas realizadas durante o processo de licenciamento. Reafirmou a competência do órgão estadual para realizar o licenciamento ambiental e apresentou parecer através do qual o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) transfere esta responsabilidade ao Inea, alegando serem os impactos circunscritos ao âmbito do Estado.
Comparando a CSA com a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Marilene Ramos afirmou ser a tecnologia da CSA muito melhor do que a da época em que foi instalada a CSN, apesar das “grandes dificuldades” que ocorreram na sua entrada em operação. Apesar dos transtornos causados, de acordo com Marilene, “nada indica que a CSA não pode funcionar”. O Inea vem buscando garantir que a operação ocorra da forma prevista no projeto – “sempre que registramos problemas, atuamos com exigências fortíssimas” – multas, notificações, etc.
A presidente do Inea esclareceu que a Licença de Instalação (LI) concedida a toda a usina é válida por 210 dias, até 28 de setembro de 2011, e que cada equipamento que fica pronto entra em fase de pré-operação por 210 dias, antes de receber a Licença de Operação (LO). Devido aos problemas apresentados, nem o alto forno 1 nem o alto forno 2, nem a aciaria, tiveram a LO concedida. A unidade de lingotamento foi desaprovada pelo órgão e não terá licença de operação, pois todas as vezes em que foi acionada, houve emissão de grafite, o que motivou notificação do Inea à empresa.
Com relação à auditoria sobre a Companhia Siderúrgica do Atlântico, a sra. Marilene alegou insuficiência daquela realizada pela Usiminas, que estaria sendo complementada por empresa de auditoria internacional para garantir a produção de aço sem que ocorra a “chuva de prata” [fuligem prateada que cai em Santa Cruz desde o início das atividades da siderúrgica]. Sendo assim, voltou a frisar, “não há razão nenhuma para o fechamento”. Os problemas que têm ocorrido até hoje, como a emissão de grafite, têm sido acompanhados através do monitoramento dos altos-fornos 1 e 2, e a quantidade de partículas totais e de partículas inaláveis se mantêm dentro dos limites dos padrões estabelecidos pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). Com relação às partículas sedimentáveis (não inaláveis), não existe restrição específica. O Inea, ainda, obrigou a empresa a instalar câmera na área do poço de emergência, que gira 360º e transmite imagens em tempo real para o órgão fiscalizador.
O deputado Paulo Ramos, do PDT, iniciou sua intervenção afirmando que o governo passado é o mesmo que o atual, e que a comparação com a CSN não é válida, uma vez que foi instalada em outra época, quando as questões ambientais ainda não eram faladas, e em uma área que foi ocupada progressivamente. Segundo o deputado, a população está sendo tratada como “cobaia”, pois as exigências ambientais deveriam anteceder o funcionamento da fábrica – a decisão de instalar a empresa e ir fazendo ajustes progressivos têm como preço a ser pago as consequências para a população.
O deputado perguntou sobre a experiência anterior com a tecnologia que está sendo usada na CSA e se ela é utilizada em algum outro país. Perguntou, ainda, se o Inea cuidou de verificar a saúde da população, se está ciente das consequências para a saúde dos moradores. Por fim, quis saber se a empresa já pagou alguma multa ou em que estágio se encontram as cobranças.
Marilene Ramos respondeu que, dentro da auditoria, a parte de saúde do trabalhador e da população do entorno vem sendo realizada pela Fundacentro (órgão do Ministério do Trabalho que cuida de saúde e segurança do trabalhador), desde maio, devendo apresentar o primeiro relatório parcial no dia 29 deste mês. Com relação à compensação de 14 milhões paga pela empresa, foi dividida entre as secretarias de saúde estadual e municipal, tendo ainda sido reservados 2 milhões para saneamento e controle de inundações no canal de São Fernando e obra de separação do esgoto e da água pluvial. Quanto à tecnologia utilizada, afirmou ser “top” em siderurgia no mundo, empregada em países europeus e nos EUA. E que a emissão de grafite não é inerente ao processo industrial, mas restrita a momentos em que há paralisação e despejo no poço de emergência, o que configura um problema operativo que tem que ser corrigido.
A deputada Lucinha também frisou a continuidade do governo atual em relação ao governo passado e afirmou que haverá nova audiência com o Inea, após a análise pela comissão dos documentos solicitados ao órgão e recebidos somente neste momento. Afirmou que o canal de São Fernando existe há 35 anos e que foi alterado pela CSA, com autorização da Feema. Segundo Lucinha, a população de Santa Cruz não foi devidamente ouvida, porque, se houvesse sido alertada, teria sido contra o projeto. “O papo era a geração de empregos”, mas só foram abertas vagas locais para “virar concreto na obra”. Frisando que teve acesso a documentos produzidos por outras instituições, ao contrário dos documentos fornecidos pelo Inea somente no momento da audiência, a deputada afirmou que toda a população do entorno “saiu perdendo” com a instalação do empreendimento: moradores, pescadores, agricultores. A presidente da comissão perguntou se o Inea reconhece a vistoria realizada em agosto de 2007 pelo GAT (órgão do Ministério Público Estadual) que constatou danos ambientais relevantes.
A sra. Marilene Ramos reconheceu e afirmou que houve replantio para compensar a supressão de vegetação além do limite autorizado. Com relação à advertência do Ministério Público Federal ao estado do Rio quanto a irregularidades no processo de licenciamento, Marilene afirmou ter encaminhado ao MPF todos os documentos solicitados. E acrescentou não ter recebido do MPE recurso pela não concessão da licença provisória.
A deputada Lucinha perguntou sobre os critérios para a liberação do segundo alto forno, ao que a presidente do Inea respondeu que o equipamento já estava em condições de funcionar e que a partida foi acompanhada por especialistas externos e ocorreu sem problemas, pois a aciaria para receber o ferro gusa já estava em pleno funcionamento. Depois disso, houve a paralisação de um guindaste dentro da aciaria, sendo o ferro gusa vertido no poço de emergência. O Inea exigiu providências para que não haja emissão de partículas quando o poço tiver de ser utilizado novamente. Esclareceu, ainda, que no primeiro evento de “chuva de prata”, o ferro gusa foi para a lingotadeira, que não funcionou. “Quando a aciaria entrou em funcionamento, os problemas acabaram”, afirmou Marilene.
A deputada Lucinha afirmou constatar que a preocupação do Inea é com a siderúrgica, enquanto a comissão da Alerj se preocupa com a população. Questionou o curto espaço de 2 meses entre a concessão das licenças prévia (LP) e de instalação (LI), além da entrada em funcionamento sem que houvesse 100% de certeza sobre a segurança. Questionou, ainda, as providências tomadas pelo Inea com relação à saúde da população, a partir do problema com o segundo alto-forno. E demandou as respostas aos questionamentos levantados por comissão da população recebida pelo Inea após manifestação no último dia 25 de fevereiro.
A presidente do Inea afirmou ter enviado ofício à secretaria de saúde (a Comissão solicitou cópia) e ter feito levantamento na vizinhança, entre 17 de dezembro de 2010 e maio de 2011, que constituiu base para o termo de referência para a auditoria sobre a saúde. Com relação às respostas encaminhadas ao Inea em fevereiro, comprometeu-se a entregar por escrito em 10 dias.
A presidente da Comissão da Alerj, “nascida e criada” na região, afirmou que sempre houve pescado na Baía de Sepetiba. Perguntou se o Inea está ciente da redução do pescado na região e se considera seguro o consumo deste pescado. A sra. Marilene respondeu que a maior preocupação do órgão recaiu sobre a montanha de rejeitos da Ingá, para a qual foi encaminhada uma solução a partir da compra da massa falida pela Usiminas.
O sr. Antonio, biólogo da FIPERJ, foi chamado a esclarecer sobre sua pesquisa na baía. Ele afirmou que a FIPERJ estuda a estrutura das comunidades de peixes em Sepetiba há 18 anos, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e que realiza estudo paralelo sobre um determinada arte de pesca – a “cercada”, prática tradicinal. Em coletas sucessivas, foram identificados peixes com diferentes deformações: na estrutura esquelética, no olho, no pedúnculo caudal. Por se tratar de situação desconhecida pelos pesquisadores, os peixes foram fotografados, mas não houve avanços neste processo por não se tratar da competência técnica da instituição. Afirmou tratarem-se de espécies muito consumidas, como tainha, sargo, corvina.
A bióloga Mônica Lima, da UERJ, perguntou se o Inea tem conhecimento dos laudos médicos emitidos pela UERJ e pela FIOCRUZ, especialmente daqueles que se referem a crianças diagnosticadas com crise nefrótica. Mônica afirmou que o que salta aos olhos de todos é a população doente, morrendo, e que o discurso do Inea opera como se nada disso estivesse acontecendo.
O sr. Tenório, funcionário do Inea, esclarecendo que é médico há 41 anos e professor da UERJ, afirmou já ter estado em Santa Cruz pelo menos 3 vezes desde a instalação da CSA. Disse ter entrado em contato com a secretaria municipal de saúde para pautar a reunião do conselho municipal de saúde e do conselho estadual de saúde, no sentido de montar uma unidade sentinela do município na região com objetivo de estabelecer o nexo causal entre a fuligem e o adoecimento dos moradores. Afirmou ter tido acesso aos laudos da UERJ, emitidos pelo Dr. Pavão, e que aguarda os laudos solicitados à Fiocruz.
A deputada Lucinha perguntou se o Inea tem conhecimento do parecer da Fiocruz sobre o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) e se confirma a prática de duplo padrão pela CSA [adotar procedimentos que não seriam aceitos em seu país de origem, a Alemanha).
A sra. Marilene respondeu que, independente do conhecimento do parecer, as emissões estão dentro do padrão estabelecido pela legislação nacional, e que o Inea tem realizado fiscalizações rotineiras e extraordinárias.
A deputada arguiu a verdade sobre o aumento das emissões de carbono em 70%, a partir da instalação da empresa. A sra. Marilene que são apenas gases do efeito estufa, e que a empresa aumenta em 15% as emissões do Estado, e em 70% as emissões de carbono do município do Rio.
Rodolfo Lobato, morador de Santa Cruz há 29 anos, cobrou resposta às 18 perguntas encaminhados por representantes dos atingidos ao Inea em fevereiro. Reafirmou que o canal de São Fernando foi desviado pela CSA. Solicitou que as imagens da câmera implantada dentro da empresa sejam enviadas à comissão da Alerj. E questionou: “se o segundo alto-forno estava ok, porque a sua liberação precisou ser ratificada pelo governador no dia 16 de dezembro?”
Ozeas, morador de Santa Cruz há 60 anos, contou que a ocupação da região foi incentivada pelo ex-presidente Getúlio Vargas com a intenção de criar uma área agrícola, conforme projeto copiado dos países baixos, destruído pela CSA. “Aquilo não podia ser construído. (…) Sou pescador, agricultor, apicultor, e tinha saúde até a CSA se instalar lá”. Ozeas estava com o braço machucado e contou que se machucou porque precisou ir pescar muito longe, devido à presença da ponta construída pela empresa, e que o seu barco não suportou a distância e quebrou – ele machucou o braço consertando o barco. E afirmou que a baía está poluída até Pedra de Guaratiba. E que a poluição do ar e a emissão de fuligem são diárias, e não apenas nos dois eventos mencionados.
Karina Kato, representante do PACS, questionou a doação de 4,6 milhões de reais ao Inea pela CSA, e pediu esclarecimentos sobre a composição do pó prateado.
A sra. Marilene se disse emocionada pelo depoimento do sr. Ozeas e afirmou estar trabalhando para que os problemas cessem, não importa quanto vai custar, senão a empresa não terá a Licença de Operação (LO). Reafirmou que o desvio do canal foi feito pela prefeitura em 1994. E que a ratificação do governador ao funcionamento do segundo alto-forno se deveu ao desconforto da equipe técnica diante do posicionamento do MPE.
A deputada Janira, do PSOL, solicitou as imagens registradas pela câmera interna no dia 12 de maio. O técnico do Inea responsável por este serviço afirmou não ser possível fornecer estas imagens, pois ainda não há “capacidade técnica” para gravá-las, e que o funcionamento da câmera ainda está em fase inicial.
Veja relato das audiências públicas sobre irregularidades no pŕocesso de licenciamento da CSA, realizadas pela Alerj nos dias 24 de maio e 14 de junho de 2011.
Nenhum comentário:
Postar um comentário